sábado, 7 de junho de 2008

Antônio José da Silva (1705-1739), O Judeu


O vazio que se abate sobre o teatro brasileiro durante o século XVIII, se preencheria, com animador alento, ao considerar nacional o teatro de Antônio José da Silva (1705-1739), O Judeu. No entanto, a mera circunstância de ter nascido no Rio de Janeiro não lhe confere cidadania literária brasileira, até porque sua vida e sua obra estão intimamente ligadas a Portugal.
O Judeu, alcunha sob a qual era conhecido, morreu queimado na fogueira, aos 34 anos de idade, pela Santa Inquisição, fez teatro no Bairro Alto de Lisboa, e suas “óperas”, como chamava suas obras por serem cantadas, se filiam longinquamente às farsas populares plautinas, e estão mais próximas do que se escrevia, em sua época, na Itália.
Sua família deixou o Brasil quando ele tinha apenas oito anos, ao que parece, por ordem da inquisição: acusaram sua mãe de judaísmo. Perseguido estupidamente pela corte religiosa, teve de esconder-se no anonimato. Em contraste com a condição de vítima, suas peças se destinam ao riso franco, e com freqüência, ao menos elegante. Num dilaceramento íntimo, que deve ter sido dos mais trágicos, Antônio José precisou renegar sempre sua origem para garantir a sobrevivência que afinal lhe foi negada.
Guerras do Alecrim e Manjerona, Anfitrião e Esopaida nada têm a ver com a nossa realidade. Tendem para a universalização de vínculos pouco nacionais. A forma escolhida para desarmar-se a polícia inquisitorial? A figura de Antônio José, o único escritor teatral de mérito da literatura portuguesa, desde Gil Vicente e Antônio Ferreira, até Almeida Garrett, permanecerá um enigma para a posteridade. Se quiser aquietar a consciência, pelo crime da Inquisição, afirma-se apenas que as “óperas” foram a manifestação espontânea e irrefreável do temperamento cômico do Judeu, que as circunstâncias adversas não deformaram. Em todo caso, nem a inspiração nem a língua das “óperas” traem a brasilidade de Antônio José. Assim como incorporamos Anchieta e tantos outros nomes estrangeiros ao nosso patrimônio literário e cultural, devemos ceder o Judeu às letras portuguesas.

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