sexta-feira, 1 de agosto de 2008

Aderbal Freire Filho


Aderbal Freire Filho (Fortaleza CE 1941). Diretor. Fundador do Grêmio Dramático Brasileiro, 1973, e do Centro de Demolição e Construção do Espetáculo, 1989, Aderbal Freire Filho assina, entre outros, Apareceu a Margarida; A Morte de Danton; A Mulher Carioca aos 22 Anos e Tiradentes. Distingue-se entre os diretores brasileiros por aliar a busca constante por novas formas de teatralismo a uma encenação que prioriza o ator como agente principal da linguagem e da comunicação das idéias do texto.
Forma-se em direito em Fortaleza onde, a partir de 1954, participa de grupos amadores e semiprofissionais de teatro. Muda-se para o Rio de Janeiro em 1970, e faz sua estréia como ator em Diário de Um Louco, de Nikolai Gogol, encenado dentro de um ônibus que percorre as ruas da cidade. Sua primeira direção é O Cordão Umbilical, de Mario Prata, em 1972. Seu primeiro grande sucesso profissional é a direção do monólogo com Marília Pêra, Apareceu a Margarida, de Roberto Athayde, 1973.
A seguir, organiza o Grêmio Dramático Brasileiro, que pretende montar simultaneamente, com o mesmo elenco num cenário único, diversas peças nacionais e mantê-las em cartaz em regime de repertório. A experiência inicial, com Um Visitante do Alto e Manual de Sobrevivência na Selva, também de Roberto Athayde, Pequeno Dicionário da Língua Feminina e Reveillon, de Flávio Márcio, todas de 1974, esbarra na fragilidade da produção e na ingenuidade dos três primeiros textos, mas revela em Reveillon, segundo o crítico Yan Michalski, "uma das peças mais originais e densas da época".
O Vôo dos Pássaros Selvagens, de Aldomar Conrado, 1975, e Crimes Delicados, de José Antônio de Souza, 1976, revelam uma sofisticação visual da sua linguagem, já detentora de uma poética própria, cuja tendência ao hermetismo traz restrições da crítica e lhe atribui a imagem de diretor maldito. Em 1977, monta A Morte de Danton, de Georg Büchner, num canteiro subterrâneo da construção do futuro metrô carioca. A ousadia experimental vem acompanhada do fracasso de público e crítica, o que interrompe prematuramente sua carreira. A imagem de diretor fora dos esquemas comerciais reaparece nos três espetáculos subseqüentes: Em Algum Lugar Fora Deste Mundo, de José Wilker, 1978, O Desembestado, de Ariovaldo Mattos, 1980, e Dom Quixote de la Pança, adaptado da novela de Cervantes pela intérprete e produtora Camilla Amado, 1980.
Na década de 80, realiza experiências com teatro de rua, em grandes montagens de dramas sacros e também com adaptações para Machado de Assis e Carlos Drummond de Andrade. Com Moço em Estado de Sítio, 1981, de Oduvaldo Vianna Filho, montado com jovens atores, inicia-se uma fase criativa em que o diretor associa a busca pela teatralidade a um processo de montagem que, com a participação do elenco, toma o texto teatral como eixo da criação. Segundo o crítico Yan Michalski: "...A premiada direção de Moço em Estado de Sitio abre uma nova e fértil fase na criação de Aderbal. O aprofundamento das suas características de equilíbrio entre o impulso experimental, a clareza da exposição e, freqüentemente, um eficiente manejo do humor (...)".1
Em 1983, dirige Besame Mucho, de Mario Prata, e leva os prêmios Paulo Pontes e Mambembe. Em 1984 encena Mão na Luva, novamente Oduvaldo Vianna Filho, com Marco Nanini e Juliana Carneiro da Cunha, levando dois Mambembes e o Golfinho de Ouro de melhor diretor.
Em 1979 dirige Crimes Delicados, de José Antônio de Souza, em Buenos Aires, quando inicia uma série de trabalhos que realiza periodicamente em países da América Latina - entre eles, Mefisto, de Klaus Mann-Arianne Mnouchkine; com a Comédia Nacional do Uruguai 1985/1986, resulta numa das suas encenações mais complexas; Egor Bulichov y otros, de Máximo Gorki, com El Galpón, de Montevidéu, 1987/1988; a ópera Simon Boccanera, de Verdi, também em Montevidéu, 1988. Na Holanda, dirige Soroco, Sua Mãe, Sua Filha, adaptado de Guimarães Rosa, com o Teatro Munganga de Amsterdã, em 1989. Participa de festivais e mostras internacionais de teatro no Uruguai e na Colômbia, onde apresenta espetáculos e orienta oficinas de direção. Seis dos seus espetáculos recebem o Prêmio Inacen de melhor espetáculo do ano, entre eles Mão na Luva, que recebe no Uruguai o Prêmio Florencio de melhor espetáculo estrangeiro de 1985. No mesmo ano, em Montevidéu, dirige Mefisto, com o elenco oficial da Comédia Nacional de Uruguai. Participa com espetáculos e/ou oficinas em festivais e mostras de diversos países da América Latina. Mantém-se atento à realidade continental e à necessidade de uma aproximação entre o teatro brasileiro e os dos países vizinhos.
No final da década de 80, Aderbal retoma um antigo projeto de constituir uma companhia de teatro e se estabelece no Teatro Gláucio Gill, desativado e destruído. Em menos de um ano, o Centro de Construção e Demolição do Espetáculo reabre o espaço e estréia, em 1990, A Mulher Carioca aos 22 Anos, um dos seus espetáculos mais elaborados. Utilizando-se de um romance na íntegra, mescla os gêneros dramático e épico em uma linguagem inovadora: oito atores se revezam em mais de trinta personagens, cada personagem assumindo os trechos narrativos referentes a si mesmo e ditos enquanto atua, de maneira a, de um lado, pessoalizar o narrador e, de outro, pluralizá-lo. O êxito desse espetáculo lhe vale o Prêmio Shell do ano, e pode ser considerado um dos fatores de estímulo à série de espetáculos que, na década de 90, investigam o gênero épico.
No início da década de 90, dedica-se a personagens históricos, realizando: Lampião, do próprio Aderbal, voltado ao herói do cangaço, 1991; O Tiro que Mudou a História, dele e de Carlos Eduardo Novaes, sobre Getúlio Vargas, 1991; Tiradentes, Inconfidência no Rio, dos mesmos autores, sobre o conspirador mineiro, 1992. Esse último lhe vale uma encenação ímpar no teatro brasileiro. Em Tiradentes, o público é distribuído em seis ônibus, visitando separadamente seis diferentes locações no centro da cidade do Rio de Janeiro, para reencontrarem-se todos na Praça Tiradentes, cenário final do espetáculo.
O investimento na sede, no entanto, se perde quatro anos depois, quando o governo do Estado expulsa a companhia do local. Os atores seguem o diretor na sua nova sede - o Teatro Carlos Gomes, onde realizam, entre outros espetáculos e eventos, Senhora dos Afogados, de Nelson Rodrigues, em 1994. A companhia encerra suas atividades com a montagem de um musical - No Verão de 1996 -, na qual o diretor parte dos quadros de Rubens Gershman para criar uma dramaturgia fragmentada que comenta e critica os fatos sociais e políticos da cidade, como uma moderna revista.
Em 1995, encena Lima Barreto, ao Terceiro Dia, obra de Luís Alberto de Abreu, escrita dez anos antes; e Kean, adaptação de Jean-Paul Sartre da obra de Alexandre Dumas, novamente com o ator Marco Nanini. Em 1997, dirige O Carteiro e O Poeta, de Antônio Skármeta, sobre Pablo Neruda. A partir de então, passa a ser convocado para dirigir espetáculos com artistas globais.
Aderbal trabalha também fora do Rio de Janeiro, faz montagens com grupos locais, dá cursos e dirige alunos de escolas de teatro. Sua prática na criação de espetáculos combina-se a um progressivo desenvolvimento de reflexões que dão origem a textos sobre teatro, a palestras e a oficinas. O ensino é uma atividade paralela presente na sua trajetória: leciona na Casa das Artes de Laranjeiras, na Escola de Teatro Martins Pena e na Faculdade de Letras da UFRJ. Na Escola de Comunicação da UFRJ, coordena um curso de pós-graduação lato sensu.Aderbal Freire Filho privilegia dramaturgos nacionais e latino-americanos, e dedica ao texto um minucioso estudo que, realizado em conjunto com os atores no processo da encenação, serve de alavanca à criação da linguagem de cada espetáculo. Percorre, ao longo da sua carreira, uma gama variada de linguagens e projetos cênicos, e caracteriza-se pela ênfase à função questionadora do processo de criação teatral. Dá um depoimento sobre a sua trajetória, a sua visão do teatro e expõe o seu processo de trabalho e método de encenação pessoal, colhido por Rúben Castilho.

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